Hamangaí Pataxó sobre a voz do jovem na luta ambiental

11:00

     

        Hamangaí é uma jovem indígena da aldeia Caramuru Catarina Paraguaçú, localizada no Sul da Bahia próxima à cidade de Pau-Brasil. Ela tem 23 anos e com ainda menos já fez muitas coisas, como discursar na Cúpula de Jovens Ativistas da Organização das Nações Unidas em Genebra, em 2019, falando em nome do Brasil, dos indígenas e da luta ambiental que é travada por diversas pessoas há muitos e muitos anos.

Eu conheci um pouco do trabalho realizado pela Hamangaí, não me lembro exatamente como, mas a acompanhava pelo Instagram há algum tempo e então entrei em contato para saber um pouco mais sobre sua história que serve de exemplo a jovens como nós. Queria saber se Hamangaí poderia falar um pouco sobre como começar nesse mundo de ativismo, sobre como se localizar e não perder as esperanças, como fazer algo, já que muitas vezes nos encontramos perdidos.

Conversamos no começo de fevereiro e agora consigo trazer em um "podcast" (e também resumido nesse post) como foi esse primeiro encontro, que já posso dizer ter sido muito inspirador. Inspiração essa que também vem com a organização da qual Hamangaí faz parte, o Engajamundo, um movimento que une jovens engajados de todos os cantos do Brasil e que não visa apenas iniciar ações, mas também educar esses jovens dispostos a lutar por diferentes temas, seja igualdade de gênero, biodiversidade, clima, cidades e comunidades sustentáveis, ou ainda, agenda de desenvolvimento sustentável, como são os subgrupos dentro da organização. Hamangaí destaca os grupos de trabalho que existem dentro do Engaja, os grupos de estudo, os projetos realizados de jovem para jovem, com linguagem simplificada sobre temas importantíssimos, como o podcast "Pimenta pra Jovem é Refresco", ainda as oportunidades e conhecimentos que o grupo lhe permitiu ter. 

Essa publicação ainda será repartida em outras postagens mais a frente, com pequenos tópicos para permitir uma leitura mais rápida e dinâmica, mas caso queira ouvir a conversa completa, já fique aqui lendo e ouvindo a entrevista!

Apresentação: Hamangaí Marcos Melo Pataxó, tem 23 anos é da aldeia Caramuru Catarina Paraguaçú, no sul da Bahia próxima à cidade de Pau-Brasil e aos 19 anos deixou a aldeia para estudar medicina veterinária. Desde 2017 faz parte do Engajamundo e atualmente trabalha no Grupo de Trabalho sobre o tema Gênero, também é coordenadora de articulação de uma nova plataforma de ativismo que está surgindo com a finalidade de tornar o ativismo em si, mais acessível à todos. Também é conselheira consultiva de uma organização voltada para os direitos de mulheres e meninas brasileiras.

A primeira pergunta que fiz para Hamangaí, foi sobre quando ela sentiu a necessidade de começar a falar ao público.

"Não foi uma tarefa fácil", ela diz ao comentar sobre sua timidez. Mas tudo começou realmente em 2015, quando participou do Acampamento Terra Livre que acontece em Brasília e reúne povos indígenas de todo o Brasil. Lá ela teve contato com grandes líderes indígenas, como o Cacique Raoni e Sônia Guajajara. Foi naquele momento, em que viu diversas pessoas falando sobre suas demandas, Hamangaí passou a se questionar sobre qual seria seu papel nessa luta quanto jovem. Além disso, uma resposta violenta a um protesto pacífico realizado em frente ao Congresso Nacional, lhe impactou de uma maneira dura: 

                "Ali foi o meu despertar, foi uma chacoalhada pra entender que o meu povo está sendo atacado diariamente, está morrendo todos os dias, e que eu posso fazer? O que eu tenho que fazer, na verdade? Eu não posso ficar calada, não posso deixar que a timidez me paralise, não posso deixar de estar nos espaços, falando da nossa realidade."

Buscando saber mais, em 2016 Hamangaí participou de um encontro de jovens de 8 aldeias diferentes da região nordeste, e em meio àquela conversa em que a pauta era o quanto suas áreas estavam sendo ocupadas e desmatadas, o quanto seus hábitos alimentares mudaram, ela entendeu que tudo já estava alterado, mas conversar e estar com outros jovens, lhe permitiu ter esperanças sobre o que é possível ser feito quando se está unido. 

                 "A missão do jovem indígena é dar continuidade nessa luta que nossos antepassados iniciaram. É uma luta milenar, que a gente como jovem tem que ter essa responsabilidade em seguir."

Mas mais do que esses eventos anteriores, Hamangaí vivenciou a seca completa do rio aos fundos de sua aldeia, onde brincou quando criança. Aquilo foi duro e dolorido de presenciar, também em 2015, gerando todos os questionamentos que a fizeram avançar.

E sobre o Engajamundo, quando questionada sobre como a organização a ajudou e pode ajudar outros jovens, Hamangaí diz primeiro de tudo que a sua timidez foi vencida com sua entrada no grupo e com reuniões locais, principalmente no encontro nacional de jovens que ocorreu na Amazônia, com 60 membros da organização, durante 1 semana, em que realizaram diversos atos como contra a especulação imobiliária da área. 

                    "Acho que pra mim foi isso, de quebrar essa timidez, entender o meu papel e como posso atuar, e também conhecer determinados assuntos que eu não tinha aprofundamento, por exemplo ativismo, que eu não sabia o que era ou a dimensão dessa palavra; mudanças climáticas, que foi onde eu tive o primeiro contato sobre isso; coisas relacionadas ao universo de leis..."

O Engaja tem ainda grupos de estudos para ensinar tais temas e pautas de níveis nacional e internacional, e como isso perpassa em nossa realidade, e o que podemos fazer em nível local até que chegue em outras instâncias.

A organização também a possibilitou a estar em locais necessários para que um jovem indígena esteja, para se fazer ouvido, como a sua presença na Conferência de Clima na ONU em 2018.

O Engaja utiliza de todas as habilidades dos jovens para o ativismo, desde danças à escrita, nada é desperdiçado. Existem ainda núcleos locais (os NLs) em 24 cidades do Brasil, porque atuando em nível local se expande até internacional, é dessa forma que trabalham. Como no Rio de Janeiro, onde o núcleo local tem um projeto de levar o assunto "mudanças climáticas" aos jovens da periferia.

                    "Essa rede acolheu as minhas dores, todas as angústias que a gente chega a ficar sem esperanças, sem saber que rumo tomar. E ali, você encontra outros jovens com o mesmo propósito de fazer um mundo melhor."

Hamangaí se diz muito feliz por ver a diversidade dentro do Engaja, agora existem muitos outros jovens indígenas do que quando começou, eles têm membros quilombolas, ribeirinhos, jovens de todos os cantos do Brasil buscando fazer a diferença. Dentro do GT de Gênero, ela comenta sobre uma cartilha que alerta sobre o câncer de mama em meio aos jovens, chamada "Os Astros Dizem" e também comenta sobre o documento "Visão das Juventudes para o Desenvolvimento do Brasil", organizado por 25 jovens de todos os subgrupos dentro do Engaja, comentando os macro-temas e posicionando o Engajamundo sobre eles.

                    "São sonhos individuais, mas muito além de ser sonhos individuais, é um sonho coletivo, de toda a organização do Engaja Mundo, e que com certeza aqueles posicionamentos também são sonhos de muito cidadão, vários outros jovens espalhados pelo Brasil."

Mas, diante da situação atual do Brasil, eu comentei com Hamangaí sobre a política, perguntei se ela tem algum tipo de esperança que os políticos em si acordem para promover a preservação, ou se isso caberá apenas à nós mesmos fazer, como sociedade civil.

                    "O que a gente tem visto é um retrocesso. Retrocesso atrás de outro, em vários sentidos. Quando a gente dá um passo a frente, damos 10 para trás, o que vem de um modelo de desenvolvimento que não respeita a vida, que põe em cima da vida interesses econômicos e políticos."

Ela diz não ver uma melhora enquanto a sociedade civil não estiver unida e organizada, defende que é preciso fazer uma análise de nossos papéis não apenas no individual, mas no coletivo, pensando também em quem estamos elegendo e, além disso, pensar em quem patrocina as pessoas que estamos elegendo, tais como os projetos de leis e o que realmente são, com uma análise mais aprofundada sobre o tipo de desenvolvimento que estão vendendo.

Hamangaí ainda propõe soluções, caminhando desde o debate escolar, sobre temas como por exemplo o racismo ambiental e climático - um tema ainda novo, mas que busca entender sobre quem está sofrendo na pele com a emergência climática. E além disso, a importância de defender não apenas a pauta ambiental, mas quem está na linha de frente, como os povos indígenas, que muitas vezes dão as suas vidas para defender um bem comum. Mas claro que não há apenas a nossa responsabilidade, mas também a do Estado e de grandes empresas que degradam, ignorando protocolos de consulta para instalação de suas estruturas, por exemplo.

Sobre como chegar em crianças e jovens, além daquelas pessoas que estão em um local cômodo, Hamangaí me diz que devemos ouvir as crianças, entender o que elas sentem e nos inspirar na esperança delas. Não devemos retirar a infância colocando a responsabilidade de crianças e jovens serem "o futuro", nós somos o presente também e muitos de nós já estamos falando.

Sobre as pessoas em seu local de acomodação, tudo começa com uma auto-avaliação para entender quais os privilégios existentes e como podemos usar desses privilégios para difundir o conhecimento, para estender a mão. Ter privilégios te permite a fazer mais, como por exemplo: alguém que sabe falar inglês pode levar esse ensinamento a outras pessoas que não têm condições de fazer um curso. Qualquer pessoa tem a capacidade de gerar um bom impacto no mundo (o fotógrafo Dan Eldon já dizia isso).

E por fim, para encerrar a conversa, pedi que Hamangaí nos desse dicas, dicas para jovens que querem começar e não sabem como, ou que querem conhecer mais do assunto.

Entre suas dicas estão o podcast "Pimenta pra jovem é refresco", totalmente produzido por membros de Engajamundo, disponível no spotify e outras plataformas, que trata sobre temas sérios e considerados, muitas vezes como, "chatos", por meio de uma linguagem prática e acessível, que não te cansa, ao contrário, apenas te motiva, tornando tudo mais didático. E também a Mostra Amotara - Olhares das Mulheres Indígenas, que compartilhará, agora em março, materiais audiovisuais produzidos por cineastas indígenas, exibido em formato online, que nos permitirá aprender com o cultivo da oralidade, do executar e do observar, que os povos indígenas sempre utilizaram e que também está na nossa hora de aprender.

Para saber mais sobre o que foi falado aqui, acesse os links abaixo:

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